Em pelo menos 80 unidades as condições são consideradas péssimas ou ruins conforme critérios avaliados pelo mesmo órgão
As penitenciárias de Minas Gerais acolhem 20.693 pessoas a mais do que a capacidade. Isso significa que um terço dos detentos que ocupam as celas dos presídios mineiros não tem espaço adequado para cumprimento da pena e precisa se espremer em celas superlotadas, conforme mapeamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Em pelo menos 80 unidades as condições são consideradas péssimas ou ruins conforme critérios avaliados pelo mesmo órgão. O que mostra que as torturas identificadas em três presídios pelo Ministério da Justiça, e listadas em documento sigiloso que a reportagem teve acesso, não são as únicas violações de direitos humanos ocorridas atrás das grades mineiras.
O levantamento feito pelo CNJ levou em consideração 218 estabelecimentos prisionais no Estado. Nessas unidades, foram contabilizadas 43.757 vagas, enquanto o número de encarcerados é de 64.452. A maioria dos detentos, cerca de 31 mil, está no regime fechado, enquanto aqueles presos provisoriamente são 20.031. A situação poderia ser ainda pior, uma vez que os dados desconsideram a situação de 160 cidades mineiras que se negaram a repassar informações sobre o atual cenário carcerário.
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A Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) não negou o problema e, em nota, disse que a situação de unidades prisionais “que porventura operam acima de suas capacidades e o déficit de vagas são realidades que pertencem não apenas ao Estado de Minas Gerais, mas a todo país”. A pasta prometeu a abertura de 950 novas vagas neste ano. Porém, 612 delas já foram inauguradas em Itajubá e Divinópolis e outras 338 entregues em breve em Ubá. Há outras unidades em ampliação e construção, como o Presídio de Lavras, com 600 vagas e o anexo de Iturama, com outras 600. Essas duas sem data de entrega. Para além disso, o Estado prevê dezenas de reformas que deverão abrir mais 696 vagas no sistema prisional mineiro. Serão destinados R$ 74 milhões nessas intervenções e também não foi informada a data de conclusão.
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Péssimas condições
O levantamento do CNJ também avaliou a condição dos presídios em Minas Gerais. Dos 218 avaliados, 64 foram avaliados como péssimos e 16 como ruins. Os regulares foram 70, enquanto aqueles com situações boas são 56.
O especialista em segurança pública e professor da PUC Minas, Luis Flávio Sapori, considera que os dados de superlotação e de condições dos presídios são preocupantes e mostram a situação precária. No entanto, ele avalia que Minas Gerais é um dos Estados menos precários. Segundo o CNJ, Minas Gerais é o 10º Estado com maior número de déficit de vagas em presídios. Apenas quatro unidades da federação (Amazonas, Alagoas, Maranhão e Bahia) têm menos presos que vagas nos respectivos sistemas. A nível nacional, o Conselho Nacional de Justiça listou 1.986 presídios que, juntos, têm mais de 253 mil vagas deficitárias.
“Mas de qualquer maneira, isso não significa acomodação. Ao contrário, o desafio ainda é muito grande. A superlotação só se resolve mantendo e ampliando as audiências de custódia. Elas são fundamentais, elas servem para filtrar melhor os flagrantes realizados pela polícia, e contém, em alguma medida, a prisão provisória excessiva. Então, ampliar e fortalecer o sistema de audiência de custódia é importante e isso depende muito do TJMG. Segundo lugar, é fundamental ampliar construções. Minas Gerais precisaria nos próximos quatro ou cinco anos abrir pelo menos 10 mil vagas, seria o razoável para manter o sistema minimamente equacionado para a próxima década. Abrir 10 mil vagas vai significar 20 unidades prisionais espalhadas por várias regiões do Estado, seria uma meta minimamente razoável para os próximos anos em Minas Gerais. Para esse governo e para o próximo que vai suceder o governador Zema, não há outra solução nesse sentido para lidar com a superlotação”, avaliou.
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Já o juiz de Execuções Penais de Contagem, Wagner Cavalieri, não entende que a solução passa pelas audiências de custódia. “A solução é investimento no sistema, melhor aplicação da legislação e efetividade das punições para que a gente não incentive cada vez mais que elementos em conflito com a lei continuem perpetrando crimes, ainda que aparentemente de menor gravidade, e que também não influenciem outros indivíduos do seu convívio”, declarou.
O magistrado entende que existe uma narrativa na sociedade de que há um encarceramento em massa. “Na verdade, o que acontece é que a população do país foi crescendo, (mas) os investimentos na área prisional não acompanharam esse crescimento em todos os aspectos, inclusive na criação de vagas. E, com isso, as unidades foram ficando realmente com número de presos acima da capacidade projetada. O número de agentes ou policiais penais também não acompanha esse crescimento e para você poder desenvolver qualquer trabalho de ressocialização e recuperação você precisa de mão de obra. Tanto no aspecto disciplinar quanto no educacional, que afinal de contas é uma das finalidades do cumprimento de pena”, ponderou Cavalieri.
Foto: Ilustração
Panorama Pop com O Tempo